A
primeira viagem que nós dois fizemos juntos foi para o Parque Estadual
Turístico do Alto do Ribeira, mais conhecido como PETAR, no estado de São
Paulo. Se embrenhando por entre fendas enlameadas, escalando pedras para cair
de bunda no chão e morrendo de frio nas águas geladas de um rio barrento, nós
descobrimos o amor. O apoio entusiástico de Flit, Zanella e Leilinha regados a
algum forró e muita cachaça de banana ajudaram bastante - que romântico!
Mas
foi ali que eu descobri que o moço era apaixonado por cavernas e adorava
colocar uma lanterna de cabeça para bancar o espeleólogo por entre as passagens
claustrofóbicas destas formações escuras. E depois de algumas incursões não é
que eu virei uma cavernícola bem ajeitadinha? Foi por isso que, assim que
soubemos da existência do Parque Nacional de Mulu, em Borneo - Sarawak, não
pensamos duas vezes em correr pra lá.
A
aventura começou logo no aeroporto. Por ser uma região muito isolada só é
possível chegar no parque nacional por meio de uma única companhia aérea que
opera um avião turbo hélice, daqueles que levam não mais do que 40 pessoas e a
cada corrente de ar mais forte você solta um "putaqueparió". É claro
que só fomos saber disso quando chegamos no aeroporto e resolvemos de última
hora mudar todo itinerário e voar pro parque .
Tivemos
a incrível sorte de pegar os dois últimos assentos, mudamos o nosso vôo da
AirAsia, passamos uma única noite em Miri (completamente dispensável, se
possível vá direto para Mulu) e no dia seguinte embarcamos.
Chegando lá,
descobrimos mais uma vez que tiramos a sorte grande porque normalmente as
entradas para o parque nos meses de férias esgotam com semanas de antecedência
- e eles tinham não mais do que 5 vagas para os dias que queríamos ficar.
Além
disso, por ser um lugar completamente isolado, os opções de hospedagem são
escassas e a alimentação, por questões logísticas, não é barata. Resumo da
ópera: mais uma vez o anjo que protege os bêbados, as criancinhas e os
mochileiros olhou por nós, do contrário cairíamos numa grande roubada. E a dica
mais importante de todas é não ir pra lá na louca, sem fazer as reservas do
parque, dos passeios (como vamos relatar mais pra frente) e da hospedagem com
antecedência porque a chance de ficar sem nada é grande.
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Achei que era de brinquedo. Errado! |
Apesar
de terem algumas pousadas e casas de família bastante simples para se hospedar
ao redor do parque, o legal mesmo é ficar lá dentro. Não tanto pela proximidade
(tudo fica a exatamente 5 minutos de caminhada, menos o aeroporto, que fica a
dez) mas sim porque eles oferecem vários tipos de
acomodação com preços variados. Nós ficamos no alojamento, a opção mais barata
com 21 camas num galpão conjunto e banheiro compartilhado, além de armários
individuais com cadeado e uma pequena cozinha. Foi tudo muito bem a não ser por
uns ingleses que ficaram jogando baralho até as 4 da manhã seguido por chineses
que acordaram em seguida para fazer o café. Enfim, sempre tem que ter a turma
sem noção...
O
Parque Nacional de Gunung Mulu compreende cavernas e formações rochosas em meio
a uma densa floresta tropical. Descoberto há não muito templo, a expedição mais
famosa por essa região e que desvendou boa parte das formações geológicas hoje
conhecidas foi a da Sociedade Geográfica Real inglesa, entre 1977 e 1978 onde uma
equipe composta por 100 cientistas passou 15 meses em campo.
Em
2000 Mulu foi reconhecido como Patrimônio Mundial pela UNESCO sob o critério de
ser um exemplo extraordinário da história geológica do mundo, do seu processo
evolutivo bem como pela sua beleza natural excepcional. E como não poderia deixar
de ser para um lugar destas proporções, o parque é cheio de superlativos: ali
está o maior salão natural do mundo (Sarawak Chamber), a caverna com maior
passagem única bem como um dos maiores sistemas de rios subterrâneos além da
maior caverna do mundo em volume.
Assim
que se chega ao parque, a equipe fará uma programação específica para você de
acordo com sua disponibilidade de tempo e aptidão física. Existem dois tipos de
caverna: as "show caves", que têm visitas diárias e extremamente
acessíveis por meio de uma plataforma de madeira que pauta todo o percurso; e
as "adventure caves" que são voltadas para o público mais animadinho
que quer realmente colocar o pé (e a bunda!) na lama. Estas últimas são dividas em três
gradações (introdutória, intermediária e avançada) sendo que não é permitido ir
na última sem passar por uma primeira mais fácil, sob supervisião de um guia
que dirá se você está apto ou não a ir no Avançado.
Começamos
pela Lang's Cave, uma caverna não muito grande, de aspecto intimista, cheia de
estalactites e estalagmites que se acumulam pelas paredes. Em seguida fomos
para a Deer Cave, uma caverna gigante que impressiona logo na entrada pelo
tamanho imenso de sua abertura. Ali dentro, mais de 3 milhões de morcegos
guincham e disputam espaço no teto - que lá de baixo parece tomado por uma
imensa mancha preta, formada pelos mamíferos.
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Você enxerga as pessoas na foto? |
No
final da tarde, próximo as 17h, saímos desta última caverna para deitar na
grama e se deliciar com um espetáculo único da natureza: a revoada dos
morcegos.
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Morcegos saem da caverna pontualmente as 17h30. Um espetáculo! |
Milhares de morcegos saem voando em grupos, formando círculos que
sobem pelo céu em espiral, numa espécie de "dupla hélice" formada por
centenas de indivíduos, que adquire vida própria que sai tomando o horizonte.
Este balé único acontece quando estes mamíferos de hábitos noturnos saem para
caçar pequenos insetos, dando origem ao fenômeno conhecido como "êxodo dos
morcegos".
A
visita à Caverna dos Ventos e à Clearwater é um passeio de meio dia bem legal
por todo seu conjunto. Depois de andar de canoa pelo rio, chega-se a uma
pequena vila de pescadores onde é possível comprar artesanato local e ver as
tradicionais "longhouses" ainda sendo usadas. Depois de visitar a
Caverna dos Ventos, seguimos direto para a Clearwater onde um rio se estende
por mais de 170km em vias subterrâneas, criando salões e formações nas paredes
que podem ser apreciadas até hoje.
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Piscina natural em frente às cavernas. |
No
dia seguinte fomos fazer a nossa primeira (e única) "adventure cave",
que seria o nosso teste para fazer uma mais avançada - ouvimos excelentes
recomendações da Clearwater Connection - mas infelizmente como não programamos
direito, iríamos embora no dia seguinte e tivemos que deixar para outra vez.
Fizemos a Racer Cave e aí sim tivemos um gostinho mais de aventura da
espeleologia: escalada por cordas, passagens super estreitas em fendas,
ambientes completamente escuros e muita lama fizeram deste sem dúvida o passeio
mais legal.
Saímos
de lá completamente enlameados, suadíssimos e felizes. Fizemos um grupo legal e
acabamos finalizando o dia com uma (na verdade várias) Tigers geladas,
compartilhando muitas histórias e experiências de viagem.
Ali conhecemos um
australiano que há dez anos viajava para a Indonésia para tirar suas férias e
nunca se cansava de lá. Depois de muito bate papo, nosso próximo ponto de
parada da viagem já estava completamente traçado - e esses encontros são uma
das melhores coisas que a viagem pode proporcionar.
3 comentários:
Oi, Ivan e Gabi. Tudo bem? :)
Seu post foi selecionado para a #Viajosfera, do Viaje na Viagem.
Dá uma olhada em http://www.viajenaviagem.com
Até mais,
Natalie - Boia
Não imaginava a dimensão das rochas. Beleza da natureza!
E mais uma vez fico de boca aberta, com as paisagens , com o conteudo e com a história que esta sendo traçadas por vocês! Obrigado por compartilhar esse LADO BOM DA VIDA. Continuo de tempos em tempos lendo e observando.
Sucesso pra o casal ai , energias positivas do brasil!
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